Crítica: “Te Peguei!”

“Te Peguei!”
(Tag)
Data de Estreia no Brasil: 23/08/2018
Direção: Jeff Tomsic
Distribuição: Warner Bros.

   À primeira vista, “Tag” tem várias semelhanças com outra comédia de orçamento médio lançada neste ano: “A Noite do Jogo”. Ambas trazem uma proposta bastante similar de partir de uma premissa aparentemente “boba” (lá o vício em jogos e competição e aqui uma brincadeira de “pega-pega” entre 5 homens que se estende por anos), que recebe um tratamento visual de filmes de ação, buscando o entretenimento ao mesmo tempo “aventureiro” e cômico. A comparação fica ainda mais evidente quando levamos em conta que ambos os filmes foram produzidos pelo mesmo estúdio, a Warner Bros., e, portanto, fazem parte de um mesmo esforço para imprimir um maior valor de produção, um trabalho de câmera mais elaborado e ação melhor coreografada em filmes de comédia. Infelizmente, apesar de suas muitas qualidades e de injetar um fôlego novo e uma maneira diferente de se explorar a comédia no cinema, “Tag” também apresenta basicamente os mesmos grandes defeitos de “A Noite do Jogo”.

         O primeiro deles é a falta de uma caracterização clara de personagens. E não estou nem falando de desenvolvimento de personagem, da elaboração de um arco dramático completo, mas apenas de uma apresentação básica da principal característica que definirá as ações dos personagens na história a ser contada. Dentre os 5 protagonistas, o único realmente bem definido é “Chilli” (Jake Johnson), o eterno looser que está sempre chapado e acaba rendendo boas piadas, principalmente pela boa atuação de Johnson (pra quem não lembra, ele faz o nerd da sala de controles em “Jurassic World” (2015)). O personagem de Bob Callahan (Jon Hanm), por sua vez, é a todo momento classificado por outros personagens como egocêntrico, mas poucas ações suas na trama de fato demonstram tal característica. Apesar de mostrar uma grande diversidade de campo de atuação (afinal, ele passou 7 temporadas como o estoico Don Draper em “Mad Men”) e se sair muito bem explorando o campo da comédia, Hamn acaba desperdiçado como um personagem muito secundário. Já Ed Helms como Hogan continua sendo apenas Ed Helms. Às vezes sua postura do “bobão” desajeitado é engraçada, às vezes é simplesmente patética e nem um pouco engraçada. No geral só meia boca.

          Mas onde o roteiro de Rob McKittrick e Mark Steilen erra feio mesmo é em relação aos personagens que representam “minorias” sociais. O único negro do grupo de amigos, “Sabel” (Hannibal Buress), tem a pior caracterização possível: ela é simplesmente inexistente! Em nenhum momento da trama sabemos sequer qual sua profissão ou temos qualquer noção de algum traço de sua personalidade. A apresentação do personagem, em uma sessão de terapia como paciente, parece definir sua atitude cínica e de comentários “para o público” sobre os acontecimentos da trama, que quase uniformemente falham em ser engraçados. Anna (Isla Fisher) e Susan (Leslie Bibb) são colocadas em uma posição totalmente subserviente na trama, realçando características de seus maridos, enquanto Cheryl (Rashida Jones) é usada para criar um conflito de egos dentro do grupo de amigos. De ponto positivo nessa representação feminina só a agência que a própria Cheryl e a jornalista Rebecca (Annabelle Wallis) demonstram ao se recusarem a serem totalmente relegadas ao papel de interesse amoroso. No entanto, a presença totalmente aleatória da jornalista Rebecca na viagem dos amigos de infância consegue ser o elemento mais nonsense de um filme que tem arremessos de donuts em câmera lenta.

            Diga-se de passagem, os principais acertos e erros de “Tag” são consequência direta das escolhas tomadas pelo roteiro na hora de recontar a história que o inspirou. Ao simplificar anos de brincadeiras e piadas de um grupo grande de amigos em uma jornada de 4 homens para “pegar” o invencível Jerry no mês de Maio (o mês oficial em que acontece o “pega-pega”), o filme ganha uma trama simples e que não se interpõe ao humor. Ganha também uma figura quase mitológica no Jerry de Jeremy Renner, cuja expertise ao fugir facilmente de seus amigos e antever suas ações toscas rende momentos engraçados, além de cenas com uma ação muito bem coreografada e filmada com dinamismo por Jeff Tomsic. Por outro lado, mesmo resumindo o grupo real de quase 20 amigos a 5 personagens, o roteiro não consegue trabalhar direito a caracterização de nenhum deles, criando uma dinâmica falha entre o grupo. “Tag” ainda exagera muito no número de piadas em alguns pontos, nos deixando com uma vergonha alheia desconfortável quando elas falham e abrindo mão da chance de pesar um pouco mais a mão no efeito dramático que seria necessário para desenvolver de fato a história.

             Há um ponto, no entanto, que foge a qualquer tipo de análise mais objetiva: apesar de todas as suas falhas, “Tag” consegue ser extremamente divertido (mais até que “A Noite do Jogo”). Seus 100 minutos passam como se fossem 30, conseguindo manter o público completamente entretido com a hilaridade subjacente a ver um bando de marmanjos agindo como crianças e brincando de pega-pega. Além de contar com um bom-humor geral que acerta piada atrás de piada, “Tag” tem ainda um bom valor de produção que torna tudo o que é mostrado em tela mais agradável e engajante. É uma pena mesmo que a pequena virada à um tom mais “dramédia” no final acabe ficando totalmente deslocada quanto ao resto do filme, deixando muitas pontas soltas e dobrando ainda mais a lógica. Entretanto, mesmo com essa derrapada nos últimos cinco minutos, que expõe de forma desnecessária as principais falhas do roteiro, demorei para chegar a pensar no que me desagradou em “Tag”, pois saí do cinema levemente anestesiado pela encantadora ideia de uma simples brincadeira de pega-pega, que conseguiu unir homens adultos, durante anos e anos de suas vidas, através da catarse envolvida no simples ato de se permitir agir como uma criança despreocupada, que pensa que suas amizades vão durar pra sempre.

 

 

Bom

Por Thiago Natário

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