Crítica: Eternos

Eternos
(Eternals)
Data de Estreia no Brasil: 04/11/2021
Direção: Chloé Zhao
Distribuição: Walt Disney Pictures

Avaliação: 3 de 5.

Em determinado momento de Eternos, um de seus próprios personagens faz a pergunta que todos nos questionamos desde o princípio: onde estavam os eternos quando Thanos evaporou metade do universo? No roteiro escrito por Chloé Zhao (que também assina a direção), Patrick Burleigh e Ryan Firpo os eternos são um grupo alienígena criado pelo celestial Arishem e enviado à Terra para protegê-la da ameaça dos Deviantes. Salvaguardando as civilizações humanas desde a antiga Mesopotâmia, os eternos são condenados a acompanhar conflitos, guerras e genocídios sem poder intervir, muito sutilmente auxiliando nossa evolução tecnológica ao longo dos séculos. Quando, em 1521, pensam ter aniquilado os últimos dos Deviantes, o grupo se separa e passa a viver entre os seres humanos, esperando o chamado de Arishem que finalmente os levará de volta a seu planeta natal de Olympia.

De maneira geral, há muito para se gostar em Eternos. O roteiro do filme é bastante ousado ao compor uma narrativa longa e calma, sem medo de tomar o tempo necessário para desenvolver sua história. Zhao emprega uma arriscada porém bem-sucedida estrutura de indas e vindas entre passado e presente, conferindo peso à existência imortal dos protagonistas e à sua ligação com a Terra e com a história humana. Nesse sentido, os 157 minutos de duração são bem utilizados para dar espaço e destaque a cada um da longa lista de personagens principais. Embora o foco esteja claramente (e de forma equivocada) na dupla Sersi (Gemma Chan) e Ikaris (Richard Madden), todos têm seu momento sob o holofote, o que gera excelentes cenas, apesar de alguns escorregões.

Outro ponto positivo é que a diversidade do elenco de Eternos não soa como uma manobra forçada de relações públicas por parte do estúdio, mas algo realmente integrado ao enredo, além de completamente natural. Estamos falando, afinal, de um grupo alienígena que foi moldado para se misturar entre seres humanos, não entre homens brancos heterossexuais. Vivendo entre nós desde tempos primordiais, os eternos teriam inspirado boa parte das mitologias e sistemas de crença humanas, com paralelos inteligentes entre Ikaris/Ícaro, Druig/Druida, Phastos/Hefesto, entre outros. A liderança exercida por duas mulheres não-brancas, Ajak (Salma Hayek) e Sersi, também soa como uma evolução natural da narrativa, embora seja um tanto quanto frustrante acompanhar o desenrolar do romance enfadonho desta última com Ikaris, enquanto outras relações muito mais interessantes são escanteadas.

Ainda que escorregue em alguns pontos e peque por um excesso de reviravoltas, o roteiro de Eternos é dotado de originalidade e coração. Há alguns belíssimos momentos de amizade e companheirismo, como por exemplo na relação entre Thena (Angelina Jolie) e Gilgamesh (Ma Dong-seok), entre Druig (Barry Keoghan) e Makkari (Lauren Ridloff), Sersi e Sprite (Lia McHugh). Ao mesmo tempo, a ameaça enfrentada pelos protagonistas inclui uma série de dilemas que os tocam, individualmente e como grupo, de forma profunda e intrincada, sem o protocolar raio em direção ao céu que ameaça aniquilação global ou o clichê plano de dominação mundial. Apesar de alguns momentos de CGI falho (principalmente envolvendo a Thena de Angelina Jolie, mal aproveitada) e os poderes incongruentes de Kingo (Kumail Nanjiani, ainda mais subdesenvolvido), a direção de Zhao confere um ótimo ponto de equilíbrio entre sequências de ação empolgantes e momentos poéticos de respiro e desenvolvimento narrativo.

Considerando que até aqui praticamente só fiz elogios ao filme, por que minha nota e percepção geral sobre Eternos não exala maior empolgação? A resposta, sendo 100% sincero, é que nem eu sei ao certo. Simplesmente há algo que não parece encaixar ali, principalmente nas conexões do enredo ao universo Marvel. As explicações para a inação dos eternos durante os quase 20 filmes anteriores são, no mínio, pouco satisfatórias, superadas apenas pelas forçadas e péssimas tentativas de incorporar os acontecimentos de Vingadores: Ultimato (2019) na trama. O terceiro ato do filme também sofre com viradas clichês e um clímax menos satisfatório do que poderia ter sido, seguido de uma sucessão de três ou quatro sequências de encerramento que realmente testa nossa paciência. A cena final, que tenta amarrar tudo e indicar uma possível continuidade, soa como um irritante to be continued de uma fase 4 (ou 5, ou 6, já perdi a conta) de filmes Marvel que tenho pouquíssimo interesse em acompanhar. No fim das contas, Eternos deriva suas maiores qualidades de não parecer um filme da Marvel, e seus principais defeitos de esforçar-se demais para sê-lo. Que os fãs da Marvel Studios me perdoem, mas isso só me fez questionar ainda mais se tenho interesse e paciência para continuar a acompanhar este universo.

Bom


Sobre o autor – Thiago Natário

Professor e mestre em História, é apaixonado por cinema desde que se entende por gente. Escreve análises sobre o tema aqui no H35mm desde 2014. Também escreve sobre cinema de horror no República do Medo e faz análises culturais e históricas sobre obras do gênero todas as quintas no RdMCast.


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